Estamos a caminho do final do tempo da Quarema, este tempo favorável que o Senhor nos concede viver na sua graça e no seu amor. É um bom momento de aprofundarmos esse belo momento que vivemos. Reflitamos o que Jesus pede para cada um de nós neste tempo favorável – que nos convida a meditar e refletir à luz da fé Cristã, quanto ao sentido deste tempo litúrgico na vida da Igreja no coração dos fiéis.
A Quaresma, é este tempo forte que a liturgia da Igreja, nos chama e nos impulsiona a viver com intensidade a pratica da oração jejum e a esmola como nos foi dito ao iniciar este tempo na quarta feira d4e cinzas. Estes quarenta dias são para a preparação da solenidade da Páscoa do Senhor.
A espiritualidade quaresmal é um convite para melhor vivermos este tempo de graça do Senhor. Esta reflexão pode ser útil para a vivêrcia da Quaresma em nossas comunidades eclesiais.
Infelizmente, em nosso mundo cheio de barulhos e palavras exterior, com informações desconsertadas a cada segundo e com muitas “fakes News”, de tantos meios de comunicação que invadem nossos lares e nosso íntimo, corremos o risco de deixar passar esta graça especial deste tempo favorável. Muitas vezes por conta destes barulhos exterior não escutamos a voz do Senhor que fala ao coração, e, portanto, o tempo da Quaresma passa despercebido.
A Quaresma é um itinerário de fé, uma oportunidade favorável para intensificar nossas ações concretas de caridade, com autêntica partilha e solidariedade. Iluminados por Sua Palavra, perdoados por sua Misericórdia, Jesus nos ensina a olhar o mundo com os olhos da fé e amá-lo com o coração.
O Papa Francisco em sua mensagem para este tempo lembra que somente olhando para Jesus, aprenderemos melhor a olhar com os olhos da fé e contemplar a beleza da criação com ternura e paixão. Ainda “se às vezes a caridade parece desaparecer em muitos corações humano, é verdade que no coração de Deus ela jamais desaparecerá”.
A Quaresma é uma jornada espiritual que envolve os cristãos no mesmo dinamismo da fé esperança e caridade. Este tempo é favorável para testemunhar aos homens e mulheres, do nosso tempo, o reflexo do amor de Deus pelo qual somos os destinatários graças à Páscoa.
Diante desse amor, ninguém permanece indiferente, todos podem responder ao Amor com amor, com uma vida totalmente convertida, sempre convertida no amor fraterno.
A celebração da Páscoa, do ponto vista histórico, principalmente nos primeiros três séculos da vida cristã, não teve um período específico de preparação, tal como hoje, somente séculos depois a Igreja começou a sua organização estrutural, para melhor fazer memória do itinerário espiritual de Cristo, dividindo os períodos de celebração da fé através da liturgia.
A comunidade cristã primitiva vivia tão intensamente o compromisso cristão, que culminava com o testemunho do martírio, por isso não sentia a necessidade de um período particular para renovar a conversão, o batismo era o sinal mais visível deste compromisso.
Após o decreto de Constantino dando liberdade religiosa aos cristãos, por volta do ano 313, a Igreja sente a necessidade de estabelecer um período para chamar os fiéis a uma maior coerência com o batismo; assim nascem as prescrições penitenciais relativas ao período imediatamente anterior à Páscoa.
Também no Ocidente, temos algum testemunho direto dessas prescrições; a peregrinação Egeria do ano 385, para a Espanha; Santo Agostinho para a África; e Santo Ambrósio para Milão. No entanto, foi somente no final do século IV, que o período denominado Quaresma aparece melhor estruturado como a conhecemos hoje; um período de quarenta dias caracterizados por jejum e outras práticas penitenciais, com o objetivo de melhor preparar os cristãos para a Páscoa.
A Quaresma é um convite à intimidade mais profunda com o Senhor, e ao mesmo tempo, é uma graça especial que a tradição cristã nos concede neste caminho de preparação para a Páscoa, o centro do ano litúrgico, o mistério fundante da fé cristã. A Quaresma é, portanto, um itinerário de fé que tem um objetivo preciso: a Páscoa.
A Quaresma encontra sua razão no grande mistério da Páscoa. Este tempo é propício para a o exercício da caridade fraterna que unida à oração nos torna imitadores do redentor, vivendo a radicalidade do Evangelho no cotidiano da vida.
A partir do Evangelho de Mateus (Cf. Mt 6,1-6.16-18) página que é proclamada na quarta-feira de cinzas, a Igreja, desde os tempos imemoriais, articulou a prática da penitência quaresmal em uma tríade de obras: o jejum, a oração e esmola; linguagem emblemática para dizer realidade mais ampla que o termo usado.
Como nos ensina a tradição patrística, essas três obras devem ser vistas de maneira complementar. No século V, São Pedro Crisológo afirmava: “Estas três coisas, oração, jejum, misericórdia, são uma e recebem vida uma da outra”.
Assim, o jejum é a alma da oração, e a misericórdia é a vida do jejum. Ninguém os divide porque eles não podem ser separados. Aquele que tem apenas um ou não tem todos os três juntos, não tem nada.
No contexto da Quaresma, é importante que essas obras penitenciais assumam uma conotação eclesiástica, especialmente no contexto Eucarístico ponto ápice da fé e da liturgia da Igreja. Devemos viver desta forma, para evitar o risco de uma prática individualista, quase independentemente da Eucaristia dominical.
O tempo da Quaresma vem relembrar esta nossa vocação comum, somos o povo de Deus a caminho, será uma ocasião para reorientar nosso olhar para Jesus, o Bom Pastor, que guia os passos da Igreja e fortalece os laços de unidade e comunhão entre nós, na consciência de que é necessário investir em uma Igreja em saída, peregrina próxima de seu povo, as vezes é necessário ir onde está o povo, se quisermos encontrar os irmãos e irmãs nos lugares da vida cotidiana, e assim iluminar suas expectativas e esperanças.
Finalmente, olhar para Jesus deve significar encontrar-se como discípulos que crescem em comunhão e caminham juntos, guiados pelo Mestre, com o cajado do peregrino nas mãos e com o pão da Palavra na bolsa, a única verdadeira riqueza que a Igreja possui.
Na Quaresma temos alguns momentos fortes: 1 – A celebração da Via Sacra, em comunidade ou individual, nas sextas-feiras; 2 – Os encontros de reflexão da Campanha da Fraternidade; 3 – A Confissão auricular, preceito que todo católico deve cumprir pelo menos uma vez por ano pela Páscoa da Ressurreição; 4 – A esmola com os gestos de partilha generosa; 5 – gesto concreto do jejum que vamos fazendo nas sextas-feiras e da abstinência de carne que vamos, livremente, aderindo para livrar nosso corpo das paixões desordenadas; 6 – A coleta da Campanha da Fraternidade no Domingo de Ramos, em favor das obras sociais da Arquidiocese e do Fundo Nacional de Solidariedade. Sejamos generosos nestes gestos e momentos fortes rumo à Páscoa.
Portanto, vamos viver intensamente este tempo oportuno na alegria da fé, unidos como família de Deus, irmãos e irmãs, este é o nosso compromisso cristão, a graça que pedimos ao Senhor nesta Quaresma é que possamos abrir o coração e nos preparar para a grande Solenidade da Pascoa do Senhor.
Que Maria, a Senhora do silêncio e da ternura, continue nos acompanhando neste tempo de deserto, itinerário de fé na prática do jejum, da oração e da esmola a caminho da Páscoa.
Orani João, Cardeal Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ