A liturgia do 15º. Domingo do Tempo Comum procura definir o caminho para encontrar a vida eterna. Neste domingo, meditamos a parábola do bom samaritano. É no amor a Deus e aos outros – dizem os textos que nos são propostos – que encontramos a vida em plenitude.
O Evangelho(Lc 10,25-37) sugere que essa vida plena não está no cumprimento de determinados ritos, mas no amor (a Deus e aos irmãos). Como exemplo, apresenta-se a figura de um samaritano – um herege, um infiel, segundo os padrões judaicos, mas que é capaz de deixar tudo para estender a mão a um irmão caído na berma da estrada. “Vai e faz o mesmo” – diz Jesus a cada um dos que o querem seguir no caminho da vida plena.
A parábola é contada por Jesus a partir do diálogo com um mestre da Lei, cuja intenção era pôr Jesus em situação difícil. O que é necessário para se alcançar a vida eterna? Para “viver”, é necessário observar os mandamentos da Lei de Deus: amar a Deus e ao próximo como a si mesmo. Querendo justificar-se, o mestre da Lei levanta a questão de “quem é o próximo” Jesus, sabiamente, além de criticar, da uma sábia lição em seu interlocutor, representante das lideranças religiosas judaicas. O próximo é a quem se dirige com misericórdia em suas circunstâncias de sofrimento. É em quem se reconhece a presença de Deus. É a quem se ama concretamente, por gestos de caridade e cuidado. Conforme o ensinamento de Jesus, não existe amor abstrato e distante da realidade concreta. O amor a Deus e a si mesmo conduz, necessariamente, ao amor ao irmão, seja ele quem for, independete de raça, língua, nacionalidade e crença.
A referência aos dois religiosos que não se preocupam com o moribundo caído à beira do caminho constitui uma forte crítica à religião que não se preocupa com a realidade em que se insere. Esses religiosos praticam o culto e amam a Deus com palavras, mas não com obras. Religião verdadeira é aquela que promove um coração compassivo em seus fiéis. Do contrário, a religião acaba promovendo a alienação e a opressão.
A primeira leitura (Dt 30,10-14) reflete, sobretudo, sobre a questão do amor a Deus. Convida os batizados a fazer de Deus o centro da sua vida e a amá-lo de todo o coração. Como? Escutando a sua voz no íntimo do coração e percorrendo o caminho dos seus mandamentos. Deus escolheu Israel como seu povo, agora espera que esse povo – prefigurando todos os povos do mundo – também o acolha, mediante a observância dos seus mandamentos. A Palavra de Deus não é inacessível, mas está perto e ao alcance de todos os que amam o Senhor. Os mandamentos só produzirão efeito quando passaram da palavra escrita no papel para a acolhida no coração.
Na segunda leitura (Cl 1,15-20), São Paulo apresenta-nos um hino que propõe Cristo como a referência fundamental, como o centro à volta do qual se constrói a história e a vida de cada batizado. O texto foge, um tanto, à temática geral das outras duas leituras; no entanto, a catequese sobre a centralidade de Cristo leva-nos a pensar na importância do que Ele nos diz no Evangelho de hoje. Se Cristo é o centro a partir do qual tudo se constrói, convém escutá-l’O atentamente e fazer do amor a Deus e aos outros uma exigência fundamental da nossa caminhada. A pessoa de Jesus, sua mensagem e a sua prática nos conduzem ao coração de Deus. Ele é a autêntica imagem do Criador e o perfeito caminho que nos leva ao Pai. Seremos imagem de Deus na medida em que nos deixarmos modelar pelas palavras e ensinamentos de Jesus.
Não sejamos indiferentes a tanta violência e marginalização. Não nos é lícito fechar os olhos diante de tanto sofrimento e abandono dos pequeninos. A compaixão deve despertar nossa consciência. A compaixão nos faz sentir a dor do outro!
Se Deus é amor, Cristo é a revelação desse amor de Deus. O cristão revelará Deus à humanidade com um amor concreto pelos mais vulneráveis e desprezados da sociedade. Procuremos assumir o compromisso sinodal da Igreja: comunhão, participação e missão.
+ Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora, MG