A liturgia do 15º Domingo do Tempo Comum convida-nos a tomar consciência da importância da Palavra de Deus e da centralidade que ela deve assumir na vida dos batizados. Pela Palavra de Deus, semeada no canteiro do coração do mundo, Deus nos faz crescer e dar frutos. Em Cristo nos tornamos um terreno preparado e capaz de fazer as sementes lançadas produzirem os sinais da graça e do Reino.
A primeira leitura – Is 55,10-11 – garante-nos que a Palavra de Deus é verdadeiramente fecunda e criadora de vida. Ela dá-nos esperança, indica-nos os caminhos que devemos percorrer e dá-nos o ânimo para intervirmos no mundo. É sempre eficaz e produz sempre efeito, embora não atue sempre de acordo com os nossos interesses e critérios. O profeta compara a Palavra de Deus com a chuva restauradora que irriga a terra e proporciona boas colheitas. Assim como a chuva garante o pão aos camponeses, a Palavra de Deus, quando acolhida, garante alimento e dignidade a todos os filhos e filhas de Deus. A Palavra divina transforma e revigora o ser humano.
O Evangelho – Mt 13,1-23 – propõe-nos, em primeiro lugar, uma reflexão sobre a forma como acolhemos a Palavra e exorta-nos a ser uma “boa terra”, disponível para escutar as propostas de Jesus, para as acolher e para deixar que elas dêem abundantes frutos na nossa vida de cada dia. Garante-nos também que o “Reino” proposto por Jesus será uma realidade imparável, onde se manifestará em todo o seu esplendor e fecundidade a vida de Deus.
O capítulo 13 do Evangelho de São Mateus é o capítulo das parábolas do Reino. Por meio de comparações com realidades e imagens rotineiras, Jesus ensina sobre o mistério do Reino dos Céus. No Evangelho de hoje, contemplamos a parábola do semeador e a sua explicação, oferecida por Jesus apenas aos discípulos. Por que Ele explica o seu sentido somente para os discípulos? Apesar de as imagens da parábola serem simples, somente quem tem o coração sensível é capaz de compreender o mistério do Reino (Mt 13,15). Jesus é o Semeador que saiu a semear, imagem dos futuros semeadores cristãos.
Porém, além de ser o “Semeador”, Jesus é também a semente. Ele á semente da Palavra, a própria Palavra do Reino. Os seres humanos são os tipos de terreno: beira do caminho, espinhoso, pedregoso e terra boa. Cada pessoa tem em si todos esses tipos de terreno. A semente à beira do caminho é o coração vazio, alvo fácil para que o Maligno venha e roube a Palavra ali semeada. O coração de terreno pedregoso é aquele que recebe a Palavra com alegria, mas, diante da primeira dificuldade, desiste logo.
O terreno espinhoso representa o coração tomado pelas preocupações transitórias do mundo. Pela ilusão da riqueza, a Palavra é sufocada. Ora, a Palavra de Jesus ensina perdão, solidariedade e fraternidade, ao que o coração mundanizado se contrapõe e, sufocado, não consegue se livrar da mera “terrenidade” da vida! A semente caída em terra boa é o coração que ouve e compreende a Palavra do Reino. Produz fruto em abundância! A questão é qual é o tipo de tereno que cada um cultiva em si!
A segunda leitura – Rm 8,18-23 – apresenta uma temática (a solidariedade entre o homem e o resto da criação) que, à primeira vista, não está relacionada com o tema deste domingo – a Palavra de Deus. Podemos, no entanto, dizer que a Palavra de Deus é que fornece os critérios para que o homem possa viver “segundo o Espírito” e para que ele possa construir o “novo céu e a nova terra” com que sonhamos. Há uma sintonia entre o universo, a humanidade e Deus. Assim como os cristãos participam da glória de filhos de Deus, a criação toda – particularmente a natureza – anseia pela libertação das agressões do ser humano. A natureza e a humanidade estão envolvidas no processo de gerar o mundo novo, sonhado pelo Criador. O ser humano é convidado a restaurar o meio ambiente segundo o projeto inicial pensado por Deus.
Terreno bom é aquele que faz a semente frutificar. É a pessoa que ouve a Palavra e a compreende. Compreender a Palavra, no entanto, não significa simplesmente entende-la intelectualmente, ou mesmo decorar alguns versículos bíblicos. Palavra viva e eficaz como a de Deus só se compreende com a vivência. E se a ação e a Palavra de Deus são uma só coisa, nós a compreendemos à medida que a Palavra que ouvimos se torna ação em nossa vida.
Para produzir frutos, portanto, a Palavra de Deus precisa encontrar o bom terreno de quem está comprometido com o projeto divino de liberdade e vida; o bom terreno de pessoas animadas e esperançosas, que não desistem diante de qualquer dificuldade; o bom terreno daqueles que alimentam em si o ideal de fazer frutificar para o mundo os frutos de justiça e de paz.
A palavra de Deus semeada deve ser de salvação e bondade! Aremos o campo, com paciência e generosidade ouvindo a Palavra de Deus, fazendo a nossa vida um terreno especial para a Palavra de Deus frutificar em nossa vida, como terreno bom, para que dê frutos de compaixão e misericórdia ao mundo.
+ Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora, MG