Na oração, fugir das tentações!

quaresma e oração
Material para catequese
Material para catequese

A todo momento somos também tentados como Jesus foi e na oração, conseguimos fugir das tentações!

No início da Quaresma, sempre no primeiro domingo, a Palavra de Deus apela a repensar as nossas opções de vida e a tomar consciência dessas “tentações” que nos impedem de renascer para a vida nova, para a vida de Deus.

A primeira leitura (Dt 26,4-10) convida-nos a eliminar os falsos deuses em quem às vezes apostamos tudo e a fazer de Deus a nossa referência fundamental. Alerta-nos, na mesma lógica, contra a tentação do orgulho e da auto-suficiência, que nos levam a caminhos de egoísmo e de desumanidade, de desgraça e de morte. A leitura traz a “profissão de fé” do povo de Israel, proclamada durante uma liturgia de ação de graças pelos dons da liberdade e da terra. Durante esse culto, o povo oferecia as primícias dos frutos da colheita. Esse “credo israelita” não está fundamentado em teorias abstratas, mas no Deus da história que liberta e caminha com seu povo. Deus ouve a voz do povo oprimido e vem em seu socorro, e o povo agradece com a oferta do produto da terra e do trabalho humano.

O Evangelho (Lc 4,1-13) apresenta-nos uma catequese sobre as opções de Jesus. Lucas sugere que Jesus recusou radicalmente um caminho de materialismo, de poder, de êxito fácil, pois o plano de Deus não passava pelo egoísmo, mas pela partilha; não passava pelo autoritarismo, mas pelo serviço; não passava por manifestações espectaculares que impressionam as massas, mas por uma proposta de vida plena, apresentada com simplicidade e amor. É claro que é esse caminho que é sugerido aos que seguem Jesus.

Em seu Batismo, Jesus, enquanto rezava, foi ungido pelo Espírito Santo e proclamado como Messias, Filho amado de Deus. Ele é o Filho obediente à vontade e ao projeto do Pai. Sabendo que Jesus é o Eleito, o tentador quer desviá-lo da rota estabelecida pela vontade de Deus. Lembrando as tentações do povo de Israel durante os quarenta anos no deserto, Jesus é tentado por três vezes, durante quarenta dias, mas jamais sucumbe às seduções do maligno. Jesus não se curva diante das malícias do diabo e não dá demonstrações de sua glória. Sua glória será vista de forma antecipada apenas por seus discípulos na Transfiguração, como contemplaremos no domingo que vem. O Filho de Deus não tem necessidades vaidosas de demonstrar sua autoridade e poder para o diabo. Ele foi tentado a abandonar o projeto de Deus durante toda a sua vida e, em especial, ao ser pregado na Cruz. Prestes a ser entregue, rezava, suando sangue, para não cair na tentação de fugir da missão (Lc 22,39-46). O Evangelho de hoje encerra dizendo: “Terminada toda a tentação, o diabo afastou-se de Jesus, para retornar no tempo oportuno” (Lc 4,12). Tempo oportuno é a hora da Cruz. Mas Jesus não cede! Ele reza e diz aos discípulos: “Orai, para não cairdes em tentação” (Lc 22,40). Somos convidados a rezar para que, quando tentados, não abandonemos a Cruz e o Cristo crucificado.

A segunda leitura (Rm 10,8-13) convida-nos a prescindir de uma atitude arrogante e auto-suficiente em relação à salvação que Deus nos oferece: a salvação não é uma conquista nossa, mas um dom gratuito de Deus. É preciso, pois, “converter-se” a Jesus, isto é, reconhecê-l’O como o “Senhor” e acolher no coração a salvação que, em Jesus, Deus nos propõe. Temos, nesta leitura, a “profissão de fé” do povo cristão, a qual está fundamentada numa pessoa, Cristo Ressuscitado. Aqui está o fundamento da nossa fé: Deus ressuscitou Jesus dentre os mortos. Essa fé não pode ser apenas algo confessado com a boca, mas deve ser vivida no coração, centro de nossas convicções e desejos.

Na oração, fugir das tentações! Nós, a todo momento, somos também tentados como Jesus foi. O Filho de Deus, porém, optou pela fidelidade ao projeto do Pai, não foi egoísta e venceu todas as tentações que tiram a dignidade humana. O Evangelho nos ensina que qualquer ser humano, deixando-se conduzir pelo Espírito, assim como Jesus, é também capaz de vencer as tentações. Deixemo-nos, pois, guiar pelo Divino Espírito Santo e, nestes tempos difíceis que atravessamos, da COVID-19 e da guerra na Ucrânia, nossa ação seja de acolhida e compaixão para com os que sofrem e estão caídos no deserto da vida!

+ Eurico dos Santos Veloso

Arcebispo Emérito de Juiz de Fora, MG