Iniciamos mais um Mês Missionário. Outubro e seus encantos, depois de termos celebrado a grandiosidade da confiança e abandono em Deus de Santa Teresinha do Menino Jesus, no dia 01 de outubro, neste mês somos especialmente convidados a rezar o Santo Rosário. Neste mês vamos rezar pela evangelização: primavera missionária na Igreja – para que o sopro Divino Espírito Santo suscite uma nova primavera missionária na Igreja. Daqui de Roma, aonde me encontro em peregrinação e para a participação da Canonização da Beata Dulce dos Pobres, exemplo de dedicação aos pobres, vamos nos unir ao Papa Francisco para que a ação de Deus conduza o Sínodo Extraordinário da Pan-Amazônia. Uma Assembleia Sinodal não é um evento político-partidário. Ao contrário, imbuídos pela ação do Espírito Santo, os padres sinodais vão propor caminhos para uma renovada ação evangelizadora e missionária da Igreja na Amazônia.
Na Palavra de Deus que nos é proposta no 27º. Domingo do Tempo Comum, cruzam-se vários temas: a fé, a salvação, a radicalidade do “caminho do Reino”, etc.; mas sobressai a reflexão sobre a atitude correta que o homem deve assumir face a Deus. As leituras convidam-nos a reconhecer, com humildade, a nossa pequenez e finitude, a comprometer-nos com o “Reino” sem cálculos nem exigências, a acolher com gratidão os dons de Deus e a entregar-nos confiantes nas suas mãos.
Na primeira leitura(Cf. Hab 1,2-3;2,2-4), o profeta Habacuc interpela Deus, convoca-o para intervir no mundo e para pôr fim à violência, à injustiça, ao pecado… Deus, em resposta, confirma a sua intenção de atuar no mundo, no sentido de destruir a morte e a opressão; mas dá a entender que só o fará quando for o momento oportuno, de acordo com o seu projeto; ao homem, resta confiar e esperar pacientemente o “tempo de Deus”.
O Evangelho (Cf. Lc 17,5-10) convida os discípulos a aderir, com coragem e radicalidade, a esse projeto de vida que, em Jesus, Deus veio oferecer ao homem. A essa adesão chama-se “fé”; e dela depende a instauração do “Reino” no mundo. Os discípulos, comprometidos com a construção do “Reino” devem, no entanto, ter consciência de que não agem por si próprios; eles são, apenas, instrumentos através dos quais Deus realiza a salvação. Resta-lhes cumprir o seu papel com humildade e gratuidade, como “servos que apenas fizeram o que deviam fazer”.
Qual era a realidade social do tempo de Jesus? As pessoas daquele tempo viviam em uma sociedade estratificada. Havia senhores, havia gente livre com mais ou menos dinheiro, havia servos, havia escravos. Estas distinções eram claras e multi-geracionais, isto é: o filho de um senhor, também, seria um senhor; o filho de um servo seria um servo e assim por diante.
Claros, também, eram os padrões de comportamento entre as classes. Um mestre não dizia “por favor” e “obrigado” aos seus servos e servas. Ele mandava e os servos obedeciam. O mestre não dizia “por favor”, porque nem ele e nem o servo acreditavam que o servo estava fazendo um favor ao cumprir a ordem do seu senhor. “Somos simples servos” era a autoimagem dos subordinados. “Fizemos o que devíamos fazer” (Cf. Lc 17,10).
Quanto mais devia esta ser a atitude dos seres humanos em relação a Deus! Ele era o Senhor dos senhores, o Criador de tudo, o Governador de tudo e o Juiz de todos. Que cabimento teria para um ser humano esperar ou até exigir a gratidão deste Senhor? Que direito teria para reivindicar para si privilégios e honrarias depois de ter executado uma ordem? “Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer!
A sociedade humana mudou muito desde os tempos de Jesus. Tanto o Estado, quanto a sociedade em geral reconhecem a dignidade igualitária de todo o ser humano. “Bom dia”, “boa tarde”, “obrigado”, “por favor”, “Deus lhe pague” são salutares e nunca cairá de moda, porque não somos senhores e sim servos. Somos, como batizados, cidadãos devemos respeitar as pessoas. Temos obrigações de religião; por isso, se somos cristãos, precisamos respeitar as exigências inerentes a nossa fé.
Temos obrigações sociais; por isso, se queremos conviver bem com as pessoas, precisamos descobrir quais são nossas obrigações para com elas e tentar uma convivência responsável. Temos obrigações para conosco; por isso precisamos cuidar de nossa saúde, da saúde do corpo e da saúde da alma. E assim por diante.
Mesmo se estivéssemos sozinhos no mundo, ainda assim não estaríamos livres de obrigações. Mas quem entende a si mesmo e percebe suas relações com o mundo e com as pessoas, não encara as obrigações como um peso e sim como uma realidade da vida, que pode nos fazer felizes.
A segunda leitura (Cf. 2Tm 1,6-8.13-14) convida os discípulos a renovar cada dia o seu compromisso com Jesus Cristo e com o “Reino”. De forma especial, o autor exorta os animadores cristãos a que conduzam com fortaleza, com equilíbrio e com amor as comunidades que lhes foram confiadas e a que defendam sempre a verdade do Evangelho.
Na segunda-feira, dia 07 de outubro, iremos celebrar Nossa Senhora do Rosário, associada à vitória de Lepanto, em 1571, e que impediu o avanço do império turco sobre a Europa. São Pio V a atribuiu à Nossa Senhora do Rosário. Neste mês, unido à Nossa Senhora do Rosário confiemos todos os missionários e as missionários. Peçamos o seu patrocínio para que o Mês Missionário seja um resumo do que fez Nossa Senhora: quem honra, imita e ama a Mãe de Deus, honra, imita e ama seu Filho também. E, como Maria, fazendo o bem e sendo educado, honesto com nossas obrigações, nos relacionemos uns para com os outros, como esperamos ser bem tratados e valorizados. Quem respeita o outro recebe a graça de Deus! Amém!
+ Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora, MG