Estamos para celebrar o Domingo da Alegria, chamado de Domingo “Laetare”, ou seja, o 4º Domingo do Tempo da Quaresma. As leituras deste domingo propõem-nos o tema da “luz”. Definem a experiência cristã como “viver na luz”.
No Evangelho (Jo 9,1-41), Jesus apresenta-se como “a luz do mundo”. A sua missão é libertar os homens das trevas do egoísmo, do orgulho e da autossuficiência. Aderir à proposta de Jesus é enveredar por um caminho de liberdade e de realização que conduz à vida plena. Da ação de Jesus, nasce, assim, o Homem Novo, isto é, o Homem elevado às suas máximas potencialidades pela comunicação do Espírito de Jesus.
O tema da luz e o itinerário da fé se destacam. Toda a narrativa se compreende a partir da afirmação inicial de Jesus: “Eu sou a luz do mundo”. À luz plena dada por Jesus, o “cego de nascença”, mediante um itinerário lento e hostil, alcança a fé e confessa Jesus como Senhor! Jesus viu o cego, aproximou-se dele, tocou seus olhos e mandou se lavar em Siloé. “O cego foi, lavou-se e voltou enxergando!”. Lavou-se, representando a água, e enxergou, representando a luz, isto é, o batismo: iluminação a partir da água do Espírito Santo e da Palavra de Jesus!
Os gestos de passar o barro nos olhos e lavar-se nas águas de Siloé simbolizam a nova criação. O cego, curado da cegueira física, reconhece de forma crescente quem é Jesus, até alcançar a plena luz da fé no Senhor. De início, Jesus era apenas “o homem chamado Jesus”. Depois, Jesus é um profeta e um enviado de Deus. No final, em um encontro pessoal, Jesus se revela a ele como o Filho do Homem, Senhor e Juiz celeste. Então, o iluminado confessa: “Eu creio, Senhor!”
Enquanto o cego vê além da visão mundana, os adversários de Jesus tornam-se cada vez mais cegos. Constata-se isso ao longo da narrativa, mas especialmente no diálogo conclusivo entre Jesus e os fariseus. O ser humano tem em si a possibilidade de abrir-se à luz da fé e de fechar-se na escuridão da incredulidade. A água e a luz são símbolos do batismo, que, na Igreja primitiva, era chamado de “iluminação”. Os batizados eram chamados de “iluminados”. No batismo, Jesus, Luz do mundo, nos ilumina interiormente e nos faz novas criaturas, filhos de Deus!
Na segunda leitura (Ef 5,8-14), São Paulo propõe aos cristãos de Éfeso que recusem viver à margem de Deus (“trevas”) e que escolham a “luz”. Em concreto, Paulo explica que viver na “luz” é praticar as obras de Deus (a bondade, a justiça e a verdade). A comunidade não pode se esconder nas trevas, mas produzir frutos da luz: a bondade, a justiça e a verdade. Quem se abriu à luz de Cristo deve abandonar o caminho das trevas, feito de mentira, discórdia, intolerância e ódio. Só assim os cristãos podem se tornar luz para os outros.
A primeira leitura (1Sm 16, 1b-6-7.10-13a) não se refere diretamente ao tema da “luz” (o tema central na liturgia deste domingo). No entanto, conta a escolha de Davi para rei de Israel e a sua unção: é um ótimo pretexto para refletirmos sobre a unção que recebemos no dia do nosso batismo e que nos constituiu testemunhas da “luz” de Deus no mundo. A escolha de Davi, como rei de Israel, ele é o eleito de Deus. Os seres humanos, nem sempre inclinados a olhar o interior, focam no exterior. Mas Deus vê o interior, Ele não se preocupa com o brilhantismo das pessoas, mas espera que seus colaboradores tenham um coração reto e humilde.
Três são os símbolos fortes da liturgia de hoje que precisamos sempre ter presentes na nossa caminhada cristã. Primeiro, a unção (1ª Leitura), depois, a luz (2ª Leitura) e, por fim, a água (Evangelho), todos símbolos fortes do batismo. Somos chamados a reavivar o nosso batismo para que sejamos, no mundo, luz de Deus!
Os judeus, com suas atitudes religiosas, não se abriram ao sofrimento humano. Acabaram se fechando nos preconceitos. Preconceitos de ontem e de hoje são cegueiras que nos impedem de ver a bondade de Deus nas pessoas e nas realidades que estão diante de nós!
Este tempo favorável da Quaresma é, sobretudo, tempo de iluminação. Os fariseus, que pensavam enxergar corretamente, permanecem cegos, ao passo que o cego continua a nos convidar a um caminho de luz. Quais cegueiras, afinal, Jesus pode curar em nós?
O recado da liturgia é claro: devemos nos abrir à luz de Cristo! Nós somos filhos e filhas da luz! Jesus ilumina nossa vida e afasta as trevas que nos impedem de dedicar atenção às necessidades do próximo. Jesus nos cura de todas as nossas cegueiras e nos permite ver e julgar as realidades do mundo com os olhos da fé.
+ Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora, MG