Apenas quarenta dias… E a primeira grande promessa de Cristo se cumpre após sua paixão, morte e ressurreição. Eis que um Espírito de Consolação toma conta do pequenino rebanho e transforma seus seguidores em destemidos defensores da fé. A fé que movia seus corações e impregnava suas existências. De tímidos e apavorados expectadores dos “últimos acontecimentos de Jerusalém”, tornam-se aguerridos pregadores da Verdade que queimava suas mentes. Uma revelação enchia de euforia, tornava translúcida a insignificância de suas vidas diante do mundo. Era preciso levar adiante aquele segredo de felicidade que os envolvia naquela Festa de Pentecostes. Aqui nascia a Igreja.
Associar esses fatos e sua importância na história cristã é penetrar no grande segredo da resistência da fé, apesar das agruras e decepções que esta encontra diante do mundo. Isso em todos os tempos, desde seus primórdios, até nossos dias. “Eis que vos enviarei um Consolador”, diria Jesus, antevendo essa história de dificuldades que Ele mesmo vivenciou e que herdamos como primeiro grande obstáculo contra nossa fé. Ser cristão nunca foi fácil, nem nunca será. Nem mesmo para aqueles que conviveram com o Mestre, que seguiram seus passos, pernoitaram com Ele no deserto, nas periferias, nos vales e nas proximidades do Templo. Que presenciaram sua transfiguração no Tabor, mas também sua angústia no monte das Oliveiras. Que beberam do vinho novo em Caná da Galileia e do cálice amargo transformado em sangue na última ceia, prenúncio do Calvário. Como aceitar a consolação diante de tantas contradições? Como defender essa causa sem a visão imparcial de um defensor da Verdade, um bom advogado? Assim Jesus se referia ao Espírito Santo: “é melhor para vocês que eu vá embora, porque, se eu não for, o Advogado não virá para vocês. Mas seu eu for, eu o enviarei” (Jo 16, 7).
O Consolador advoga por nós, pela sua Igreja. Temos, pois, um defensor da fé atuante no mundo, a quem Cristo confiou nossas causas e nossa defesa diante do Demolidor. “As portas do Inferno não prevalecerão”… pois a Doutrina da Igreja seria preservada e vencedora. Mas qual a função desse Espírito que ainda hoje governa a Igreja? Jesus responde: “… desmascarar o mundo, mostrando quem é pecador, quem é o Justo e quem é o condenado. Quem é o Justo? Sou eu. (…) Quem é o condenado? É o príncipe deste mundo, que já foi condenado” (Jo 16, 8-11). Esse é nosso consolo. A certeza de que estamos num caminho de luz, guiados e amparados pelo Espírito Santo de Deus, mesmo diante da acirrada perseguição do Inimigo.
Deixemos, pois, nos embriagar pelos ensinamentos de Cristo, de sua Igreja sempre atuante no mundo. Essa doutrina continua imutável, apesar do olhar cético e irônico dos que preferem a doutrina do condenado, seguem a voz da perdição. Pedro foi o primeiro a se dar conta da ação do Espírito em sua vida. E proclamou: “Homens da Judeia e todos vocês que se encontram em Jerusalém! Compreendam o que está acontecendo e prestem atenção nas minhas palavras; estes homens não estão embriagados como vocês pensam, pois são apenas nove horas da manhã” (At 2, 14-15). Sim, era ainda muito cedo. Apesar de dois mil anos, ainda é cedo. “Estamos apenas começando”, disse o papa S. João Paulo II na virada do milênio. Ainda é cedo. Há muito a ser trabalhado no chão duro da realidade descrente, pois muitos ainda desconhecem o sabor do vinho novo que nos trouxe Jesus e seu Espírito Consolador. Precisamos por primeiro embriagar o mundo como o vinho doce de um novo Pentecostes, a Festa Definitiva da redenção que esperamos. Só então, seremos consolados…