Chega mais um doce e feliz dias 12 de outubro. Nossos olhares se voltam para a Catedral Basílica de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, em Aparecida, SP. Lá, queremos venerar a Senhora Aparecida, Rainha e Padroeira do Brasil e pedir a sua proteção em favor do nosso Brasil, neste momento histórico em que vivemos. Terminado o primeiro turno das eleições, rezamos pelos que foram eleitos e pedimos as graças divinas para os que ainda colocam seus nomes para a escolha dos eleitores em alguns Estados e em nível nacional.
A primeira leitura(Est 5,1b-2;7,2b-3) mostra que Ester aborda o rei em sua sala do trono para pedir-lhe a clemência real por todo o seu povo. Este ato exigia muita coragem, porque a etiqueta do palácio não permitia que ninguém entrasse na sala do trono – nem mesmo a rainha – sem um convite pessoal do rei. Somente se o rei, ao ver o “intruso”, baixasse a ponta do seu cetro a vida desta pessoa seria poupada. Se não baixasse a ponta, a pessoa seria sumariamente executada. Por amor ao seu povo e ao seu Deus, Ester enfrenta o desafio. Graças a Deus, o rei baixa a ponta do cetro, concede o pedido de Ester e faz com que Amá cumpra a pena de morte, mandando-o ser enforcado na forca que Amã tinha construído para por fim a Mardoqueu. A Igreja contempla na personagem de Ester uma prefiguração de Nossa Senhora Aparecida. Certamente, foi por meio de sua intercessão que os humildes pescadores do Rio Paraíba conseguiram a pesca milagrosa e evitarem os efeitos do descontentamento do governador português presente na vila de Guaratinguetá em visita oficial.
Através de Ester, a Igreja quer proclamar Nossa Senhora Aparecida como intercessora – e intercessora eficaz – em todas as necessidades do povo brasileiro. Mesmo o diabo, a personificação do mal, é impotente diante das orações de Maria, assim como Amã diante da intercessão da Rainha Ester. A nossa rainha, Maria, é humilde, como Ester, é de ascendência judia, como Ester, tem de enfrentar o dragão, como nos ensina a segunda leitura(Ap. 12,13.15). Mas Maria consegue tudo.
No texto do Apocalipse(cf. Ap 12,1.5.13a.15-16a), aparece a mulher que luta com o dragão, representante das forças das trevas e da morte. É uma mulher coroada, mas sua realeza provém exclusivamente da realeza do Filho, que “governa todas as nações com cetro de ferro” (v. 5a). O Filho é “levado para junto de Deus e do seu trono” (v. 5b), alusão à ascensão de Cristo ao céu. Isso significa que o Filho é vencedor contra as forças representadas pelo dragão. E, para usufruir dessa vitória, é necessário que cada cristão sustente a luta. No combate contra as forças do mal, o ser humano é sustentado pela fé e pela graça. Sustenta-o também a materna proteção de Maria, que não cessa de interceder a seu Filho para que a humanidade alcance a vida em plenitude.
A ideia da intercessão, na presente liturgia, concerne sobretudo à pátria brasileira, portanto uma realidade histórico-material. Pode-se, então, pedir a Maria que a ninguém faltem as condições necessárias para viver dignamente. Mas esse pedido deve traduzir também nossa disponibilidade para colaborar e participar na grande obra de amor que Cristo iniciou e assinalou em seu primeiro “sinal”, em Caná(Cf. Jo 2,1-11). Ou seja, os pedidos devem exprimir a vontade de colaborar no reino de paz e amor, pois esse reino é o meio mais seguro para fazer acontecer a realização daquilo que pedimos. Se pedimos bênçãos pela pátria, devemos estar dispostos a nos tornarmos instrumentos daquilo que pedimos (integração de todos numa sociedade justa e fraterna etc.).
No Evangelho Maria é aquela que intercede a Cristo. Ela pede o vinho da nova aliança, que significa ter vida em plenitude. E, para experimentarmos o vinho novo, é preciso fazer tudo o que Cristo nos disser (cf. Jo 2, 5). Maria é aquela que nos aponta o Filho. Seu desejo maternal para conosco é que sejamos verdadeiros seguidores de Jesus. A certeza com que Maria se dirige a Jesus, apesar de não ser ainda a hora, reflete seu verdadeiro discipulado, porque ela acreditou muito antes de ver o sinal. Por isso, Maria é verdadeira intercessora da Igreja. Ela acredita e confia na ação de Deus em favor de seu povo. Ela pede o que é mais importante para nós, cristãos: a plenitude da vida. E, se seguirmos realmente sua indicação e fizermos tudo o que Cristo nos disser, jamais nos faltará o “vinho bom”, pois o teremos em abundância. Se aprendermos isso, certamente viveremos com maior profundidade nossa devoção a Nossa Senhora Aparecida.
A dona da festa é “Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Padroeira do Brasil”. O povo a chama simplesmente de Nossa Senhora Aparecida. Para a “Imaculada Conceição” temos outra festa, em 8 de dezembro. Todavia, vale a pena, apoiados na liturgia, estabelecer um nexo entre a “imaculada conceição” (=a eleição de Maria desde a sua concepção) e seu papel de intercessora e padroeira do nosso povo. Tal nexo se encontra na ideia da “eleição”. Maria não é intercessora e padroeira por mérito próprio, mas porque Deus assim quis que fosse e a elegeu para colaborar na obra a ser levada a termo pelo filho. Toda a vida de Maria foi dedicada a Deus: este é o sentido de sua concepção sem o pecado original, conforme a Tradição da Igreja. E nesta total dedicação a Deus se baseia a sua “liberdade régia” (cf. Ester) para intervir junto a seu filho – o filho de Deus –, para apontar a necessidade de seu povo, como narra o evangelho de hoje.
Jesus, atendendo ao pedido de sua Mãe, Maria Santíssima, transformou água em vinho. Agora cabe a cada um de nós fazer comunhão no pão e vinho consagrados como uma antecipação do banquete do céu e um estímulo eficaz para a nossa colaboração na construção do Reino de Deus.
O nosso amor para com Maria há de ser amor a Jesus, e aos irmãos e irmãs. Que Nossa Senhora Aparecida, cujos os 40 anos estamos comemorando de sua restauração, depois daquele malfadado atentado, nos ajude a sermos, com Ela, restaurados em Cristo, para darmos testemunho do Ressuscitado e santificarmos o mundo, com a graça de Deus!
+ Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora, MG