No terceiro domingo da Quaresma a Palavra de Deus que hoje nos é proposta afirma, essencialmente, que o nosso Deus está sempre presente ao longo da nossa caminhada pela história e que só Ele nos oferece um horizonte de vida eterna, de realização plena, de felicidade perfeita. Oração, penitência e acusação de si mesmos são indispensáveis para combater o mal e nos saciarmos da sede da fé e do fogo do amor que só Cristo pode nos dar!
Contemplamos na liturgia deste terceiro domingo da Quaresma o Cristo que é a água para a nossa sede. Ele é a própria fonte, à qual todos podemos acorrer com nossa sede de vida, de sentido, de esperança e de fé. A Sua Palavra e a Sua Presença nos fortalecem no empenho de promover e cuidar da vida do mundo(em consonância com a Campanha da Fraternidade 2020) que tem sede de paz, dignidade e partilha.
A primeira leitura(cf. Ex 17,3-7) mostra como Deus acompanhou a caminhada dos hebreus pelo deserto do Sinai e como, nos momentos de crise, respondeu às necessidades do seu Povo. O quadro revela a pedagogia de Deus e dá-nos a chave para entender a lógica de Deus, manifestada em cada passo da história da salvação.
A segunda leitura(cf. Rm 5,1-2.5-8) repete, noutros termos, o ensinamento da primeira: Deus acompanha o seu Povo em marcha pela história; e, apesar do pecado e da infidelidade, insiste em oferecer ao seu Povo – de forma gratuita e incondicional – a salvação.
O Evangelho(cf. Jo 4,5-42) também não se afasta desta temática… Garante-nos que, através de Jesus, Deus oferece ao homem a felicidade (não a felicidade ilusória, parcial e falível, mas a vida eterna). Quem acolhe o dom de Deus e aceita Jesus como “o salvador do mundo” torna-se um Homem Novo, que vive do Espírito e que caminha ao encontro da vida plena e definitiva. No tempo de Jesus, um judeu dirigir-se à uma mulher samaritana(cf. Jo 4,7-9) era o cúmulo da impureza – qualquer contato com um samaritano tornava o judeu impuro. É misterioso o fato de que a mulher vai buscar água no poço na hora do almoço, quando Jesus estava lá(v. 5). Quando Jesus fala de Água Viva, a mulher entende água comum do poço(v. 11), mas, à medida que Jesus aprofunda o sentido do que disse, a mulher descobre que água de vida eterna é o próprio homem diante dela(v. 19). Ela se esqueceu de que fora ao poço buscar água material e descobre aquele que é fonte de água que dá vida eterna e abre seu coração a ele(v. 15-18). Jesus, também, abriu seu coração àquela mulher que nunca havia visto, revelando-lhe sua verdadeira identidade(v. 25). Por que aquela desconhecida conseguiu o que ninguém, nem seus amigos, havia conseguido? Porque possuía uma simplicidade de coração mesmo sendo pecadora; deixou Jesus educar seu desejo material e ele a conduziu ao desejo da vida do Espírito; foi sincera e transparente, não escondeu seu pecado. Muitos de nós nunca tivemos uma verdadeira experiência de Deus, porque temos dificuldade em nos reconhecer pecadores, abrir nosso coração para ele.
Jesus rompe com todas as barreiras discriminatórias baseadas em crenças religiosas. Porque para Ele o novo povo deve adorar a Deus em Espírito e Verdade. Jesus é a revelação de que Deus está presente em todos os valores de todos os povos e culturas, conferindo uma dimensão de eternidade a todo ato de amor que promove a vida. Senhor Deus, nosso Pai, nós queremos te conhecer. Mas muitas vezes os nossos olhos não vos enxergam. Assim como a Samaritana queremos te reconhecer, acolher em Jesus, vosso filho. Dá-me a graça.
O prefácio da Missa de hoje é significativo: “Ao pedir à Samaritana que lhe desse de beber, Jesus lhe dava o dom de crer. E, saciada sua sede de fé lhe acrescentou o fogo do amor”. Aprendamos com a samaritana! Sejamos abertos a Jesus e ele terá a liberdade de se revelar a nós e nos purificar com sua graça santificante e transformadora.
+ Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora, MG