No Domingo passado escutamos o Senhor Jesus, vencedor da morte, Autor da Vida, que nos revelava com doçura e profundidade: “Eu sou o Bom Pastor” (Jo 10,11). Neste 5º Domingo da Páscoa, novamente, voltamos nosso olhar para o Senhor, imolado por nós e, por nós, ressuscitado; escutemo-lo mais uma vez: “Eu sou a videira verdadeira e meu Pai é o agricultor!” Para compreender esta palavra de Jesus é necessário recordar o povo de Israel, a vinha eleita de Deus, vinha que o Senhor arrancou do Egito e plantou na terra santa; vinha que o Senhor cercou de cuidados e de carinho. Vinha que, no entanto, não deu os frutos esperados! Escutemos as queixas do Senhor pela boca do Profeta Isaías: “Que me restava fazer à minha vinha que eu não tenha feito? Por que, quando eu esperava que ela desse uvas boas, deu apenas uvas azedas? Agora vos farei saber o que vou fazer da minha vinha! Arrancarei a sua cerca para que sirva de pasto, derrubarei seu muro para que seja pisada”.
“A vinha do Senhor dos Exércitos é a casa de Israel; e os homens de Judá são a sua plantação preciosa. Deles esperava o direito, mas o que produziram foi transgressão; esperava a justiça, mas o que apareceu foram gritos de desespero” (Is 5,4-5.7). Agora surge Aquele que é o novo Israel, a verdadeira videira que dá o bom fruto, o fruto doce da obediência ao Pai até a morte e morte de cruz! Jesus é o Israel fidelíssimo, a verdadeira vinha plantada pelo Pai. Na obediência e na fidelidade, ele deu fruto de vida eterna. O salmo de meditação da Missa deste domingo, um trecho do Salmo 21, aquele mesmo que Jesus rezou na cruz e que começa com a súplica “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” – o Salmo recorda bem o preço da obediência do nosso Senhor. Na obediência ao Pai, divino Agricultor, Jesus deu para nós fruto de vida eterna. Morreu, mas está vivo para sempre! Bendito seja o Senhor! A Ele a glória.
Essa Videira viva e verdadeira (Cf. Evangelho de Jo 15,1-8), plena do Santo Espírito, que é a vida do Pai, nos vivifica. Foi por nós que Jesus, a Videira, morreu; foi por nossa causa que ele ressuscitou! Escutemo-Lo ainda: Todo ramo que em mim não dá fruto o Pai o corta; e todo ramo que dá fruto, ele o poda, para que dê mais fruto ainda. “Permaneci em mim e eu permanecerei em vós. Como não pode dá fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também vós, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira e vós sois os ramos”. Fomos enxertados na videira verdadeira: em Jesus, somos a Igreja, o novo Israel, a vinha eleita do Senhor. Somo-lo, porque, pelo batismo, fomos enxertados em Cristo e, agora, vivemos da sua seiva bendita, que é o Santo Espírito. São João nos diz na segunda leitura, que sabemos que Deus permanece conosco e nós nele porque temos o seu Espírito. Estamos unidos a Cristo de verdade, de verdade vivemos a sua vida nova, vida que ele adquiriu na ressurreição. O que o Senhor espera de nós? Ele espera bons frutos; doces da doçura do Cristo que, por nosso amor, fez-se obediente até a morte e morte de cruz!
São João nos diz na segunda leitura (Cf. 1Jo 3,18-24) que o fruto que podemos produzir é crer no Filho amado e nos amar uns aos outros, como ele nos mandou. Compreendamos que ser cristão é viver enxertados em Cristo e nos tornamos ramos da mesma videira. Podemos dizer a mesma coisa de outro modo, usando as palavras de São Paulo: Cristo é a Cabeça, nós somos os membros do corpo que é a Igreja. Os membros vivem da vida da Cabeça como os ramos vivem da seiva que brota do tronco. A Igreja nasce de Cristo, ela nos é anterior; e nós, pela graça de Deus, somos nela enxertados pelo batismo e alimentados pela eucaristia. Ser cristão é ser Igreja; e ser Igreja é estar profundamente unido a Cristo e, em Cristo, unidos uns aos outros. Vivemos a mesma vida, nutrimo-nos da mesma seiva: esta vida, esta seiva é o Santo Espírito do Ressuscitado! Fora de Cristo, que fruto daríamos? Separados do tronco, fora da videira, como permaneceríamos vivos da vida divina? Como poderíamos produzir frutos de vida eterna? É permanecendo em Cristo, cabeça e tronco da Igreja, que viveremos da sua energia, da sua seiva, isto é, do seu Espírito Santo.
Mas, isso não nos livra das dificuldades. Desde os inícios, a vida dos cristãos é marcada por provações interiores e exteriores; desde as origens há dificuldades mesmo entre os irmãos na fé. Meditemos na situação da primeira leitura deste domingo (Cf. At 9,26-31): a desconfiança da comunidade em relação a São Paulo: tribulações exteriores, tribulações interiores; momentos de dor, momentos de escuridão. Não estamos seguros em Cristo? Sim! Mas, não seguros de seguranças humanas! Jesus nos previne no Evangelho de hoje para as podas da vida, podas que o Pai consente, para que demos fruto de vida eterna, fruto de uma vida totalmente enxertada em Cristo e, com Cristo, em Deus: “Todo ramo que em mim não dá fruto o Pai o corta; e todo ramo que dá fruto, ele o limpa, para que dê mais fruto ainda”. Batizados em Cristo, n’Ele permaneçamos enxertados; alimentemo-nos da Sua seiva na eucaristia; suportemos com absoluta confiança nele as podas e purificações da vida. Se o fizermos, produziremos verdadeiro fruto, fruto de vida eterna. Amém
Orani João, Cardeal Tempesta, O.Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ