Se Adão e Eva foram as primeiras pessoas do mundo, como tiveram netos? Será que seus filhos se casaram entre si?
Pergunta
Como Adão e Eva tiveram descendentes? Foi por meio de relações incestuosas?
Resposta
A Bíblia não explica como se desenvolveu a descendência de Adão e Eva.
Sabemos que Adão e Eva tiveram muitos filhos (Gn 5, 4), dos quais os
primeiros foram Caim e Abel (Gn 4, 1-2), e conhecemos também o fato do
fratricídio (Gn 4, 3-16) que levou uma descendência de Caim (malvada e
irreligiosa – Gn 4, 17-24) separada da descendência de Set (boa e
religiosa – Gn 5, 6-32), o filho “escolhido” por Deus (Gn 4, 25-26. 5,
3-4) para substituir Abel, do qual depois se chegará a Noé e o dilúvio.
Como se gerou essa descendência? Houve muitas hipóteses e todas
acabaram encontrando o problema do incesto (relações sexuais entre
parentes próximos), fruto de uma interpretação literal da Bíblia.
Para tentar mitigar o problema, foram buscadas muitas explicações: não
havia uma lei contra o incesto; viviam muitos anos e casar-se com
sobrinhos parece que era “menos grave” etc. Mas nenhuma delas deu uma
explicação convincente.
Felizmente, os dois últimos séculos de
estudos da Bíblia nos permitem compreender algumas coisas sobre ela que
nos ajudam a resolver dificuldades como esta.
Sobre como se deu a descendência de Adão e Eva, é preciso dizer duas coisas:
A primeira se refere ao gênero literário
dos primeiros capítulos do Gênesis. Os estudos deixam claro que Gn 1-11
não pode ser considerado uma narração histórica real. Não podemos achar
que esses capítulos sejam a crônica dos primeiros anos da história
humana.
Além disso, sua redação, procedente de fontes orais,
aconteceu na época do exílio e pós-exílio babilônico (aprox. séc. VI-V
a.C.). A intenção dos autores não era fazer história, mas contar
verdades fundamentais para a relação do homem com Deus.
Mas,
ao mesmo tempo, é preciso ter claro que tampouco se trata de mitologia,
ainda que o texto utilize uma linguagem mítica. João Paulo II explicou
isso: “O termo ‘mito’ não designa um conteúdo fabuloso, mas simplesmente
um modo arcaico de expressar um conteúdo mais profundo” (Catequese de
7/11/1979).
Para compreender isso, podemos comparar o texto
com as parábolas de Jesus. Está claro que tais parábolas têm uma
linguagem de “conto” e que não são relatos históricos. No entanto,
expressam, muito melhor que uma crônica, qual é a verdade das coisas, e
assim “contam” a “verdadeira” história da humanidade (por exemplo, o
filho pródigo).
Acontece o mesmo com os primeiros capítulos do Gênesis: “Estes textos não devem ser interpretados como história nem como mito (…), senão que o texto proclama a relação particular que Deus mantém com sua criação” (W. Brueggemann, Genesi, Claudiana, Turim 2002, p. 34).
A segunda reflexão é mais simples e deriva da primeira: quando a Bíblia
não especifica e não dá detalhes, isso não é necessariamente um erro,
também porque não dizer tudo faz parte do estilo narrativo que estes
relatos utilizam.
Quem não gostaria de saber a que idade Maria
teve Jesus ou o que Ele fez nos primeiros 30 anos da sua vida? Quantas
curiosidades temos sobre a Bíblia! Mas as Escrituras não foram redigidas
sob a inspiração de deus para satisfazer nossa curiosidade, mas para
fazer-nos crescer e agir segundo a vontade de Deus.
Ainda que
soubéssemos como Caim e Set tiveram filhos, isso não seria de muita
utilidade. Os textos como Gn 1-11 contêm a verdade sobre o projeto de
Deus com relação à criação do homem, sobre a Queda e suas consequências,
e esta é a verdade que precisamos buscar.